Um hotel na Lapa, bairro boêmio do Rio de Janeiro, é um retrato típico
do mosaico de pessoas que circulam na região: vivem nele travestis,
cafetinas, pretensos escritores, jornalistas de porta de bar, ingênuos
iludidos que vêm do interior tentar a sorte na cidade grande, pessoas
com muita pompa e muito pouca circunstância, além de outros moradores de
perfil “exótico”. É neste local que crimes bárbaros vão ganhar as
páginas de jornais e espaços em noticiários de TV: a especialidade do
assassino é fazer rolar, literalmente, as cabeças de suas vítimas. Este
é o mote de Hotel Brasil – o mistério das cabeças degoladas, 1999, romance que marca a estreia de Frei Betto na literatura policial. Retrato sem retoques da vida na metrópole, Hotel Brasil aborda
temas polêmicos como a violência policial, as drogas e a marginalização
dos miseráveis. O perfil dos personagens é apresentado em forma de
depoimentos dados à polícia: Seu Marçal é um velho negociante de pedras
preciosas, que traz das viagens que faz à sua terra natal, em Minas
Gerais; Rosaura veio tentar a sorte no Rio, trabalha como faxineira, mas
sonha em ser atriz de TV; madame Larência é uma velha cafetina que
optou pelo isolamento emocional; Jorge é o servente do hotel, que dorme
entre vassouras e detergentes; Marcelo é o clássico jornalista
revolucionário-de-tablóide; Pacheco é um assessor político que conhece
meio mundo de pessoas importantes, mas prefere a companhia de
prostitutas e dos hóspedes do hotel decadente que escolheu para viver;
Dona Dinó é a senhoria do hotel que vive com Osíris, o gato, em seu
colo; Diamante Negro é travesti com orgulho e tagarela por excelência.
Por fim, Cândido é profissional das letras, poeta por vocação e redator
por necessidade. Solitário, encontra consolo trabalhando com menores
carentes.Todos eles caem na mira do delegado Olinto Del Bosco, que segue a
cartilha dos métodos policiais de interrogatório à risca e que inclui
intimidação, falsa compaixão e tortura. Achar o assassino do hotel é sua
missão mais importante e ele não medirá esforços para encontrar o
culpado, ou melhor, um culpado. E todos são suspeitos. Em meio à onda de crimes, Frei Betto abre espaço para discutir a
violência urbana, particularmente, a situação de menores carentes que
acabam seguindo uma vida de crimes, muitas vezes, sem alternativa, em
uma comovente história paralela. Cândido é seu porta-voz. Em busca de
algo maior que preencha sua vida medíocre de redator de editora
responsável pela confecção de fascículos que falam de sexo e
espiritualidade, o poeta desenvolve uma relação paternal por Bia, menor
que foge de uma unidade para menores infratores, perseguida por
criminosos e policiais corruptos; e uma relação platônica com Mônica,
antropóloga que não consegue falar de seus sentimentos e os revela em
cartas que nunca são enviadas ao destinatário. Em Hotel Brasil, Frei Betto mistura, em prosa fluida, suspense,
romance e crítica social em uma história que é um caleidoscópio do país
em que vivemos.Fonte: Editora Rocco.
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